14 setembro 2006

"Não detesto nenhum partido, exceto o seu"

O texto a seguir é da Soninha, e foi publicado em seu blog.


Não detesto nenhum partido, exceto o seu

“Eu não voto em partido, voto na pessoa”. Quantas vezes você já ouviu ou disse isso? Dadas as fronteiras muito borradas entre partidos no Brasil, a inconsistência e o desconjuntamento das agremiações, as alianças sem nenhuma lógica ideológica, a profusão de siglas ridiculamente oportunistas, como criticar os eleitores por se prender mais à avaliação da pessoa física do que da legenda a que ela pertence? Como comparar, por exemplo, José Serra e Havanir Nimitz, ex-Prona, atual tucana? Roberto Freire, Blairo Maggi e Miriam Athiê, vereadora pelo PPS em São Paulo?


“Eu não voto em partido, voto na pessoa. Mas não voto em você porque você é do PT, e eu nunca mais voto em ninguém do PT”.


Bom, aí a coisa muda de figura... Quando se trata do PT, aí vale a legenda, vale o julgamento em bloco, vale a idéia de partido. Negativamente, naturalmente. Faz sentido?


Essa conversa aconteceu no sábado de manhã. Não me contive: “Quer dizer que o único partido que você condena em bloco, de ponta a ponta, é o PT?”. “É, essa roubalheira...”. “Nos outros partidos nunca teve roubalheira?”. Outra pessoa interveio: “Colocaram um monte de gente do partido sem qualificação técnica para ocupar cargos técnicos”... “Eu acho isso uma merda, mas é só o PT que faz isso?”. “Mas eu votei no PT pra fazer diferente dos outros, e chega lá e faz igual? Nunca mais!”. “Eu também acho que não devia ter feito nada do que condena nos outros; não é desculpa para fazer igual. Não concordo, não perdôo, vou sempre brigar para que não seja assim. Mas os outros, os tais que sempre fizeram o que o PT sempre disse que não ia fazer, não vão ser condenados também?”.


A pessoa que me interpelou – acho que não tem por que não falar quem era; a Hortência – vai votar no Alckmin. Normal, normalíssimo, não estava tentando convencê-la a votar no Lula. Mas se ela votou no Lula porque queria que o PT fosse diferente “dos outros”, esses “outros” não incluíam o PSDB? Então ela quis se ver livre do PSDB, mas já perdoou. Vota em alguns tucanos, ainda que não goste de todos. Mas em petista nenhum, nunca mais?


“Se os tucanos fizeram alguma coisa de errado, também não voto mais neles!”. Então, ela está dizendo que os tucanos nunca fizeram nada de errado?


Além de “quadrilha”, o qualificativo mais recente, uma das maiores “acusações” feitas ao PT sempre foi o de ser “monopolista da ética”. Agora, parece deter o monopólio da falta de ética. Os petistas são anti-éticos. Todos. Os outros, não. Nenhum. Tá lá a propaganda do PSDB e do PFL, um frevo super animado: “Que decepção/ Pra essa gente/ Meu voto eu não dou não/ Diga não à bandalheira: vote nos candidatos a deputado do PSDB/PFL”. Quer dizer, o PT é “essa gente” (melhor que “essa raça”, como disse o outro um tempo atrás). E o PSDB (e o PFL!) são imunes, excluídos, isentos de “bandalheira”. Ah, sim, devem ter adquirido o monopólio sobre a ética, e serem os atuais detentores da perfeição. Ainda vão ser acusados de formação de cartel...


“Não voto em partido, voto na pessoa. Mas não voto em ninguém do PT”. Antes de ir embora, Hortência ainda me disse: “Sai do PT, que eu voto em você”. Bom, assim que eu encontrar um partido que não tenha pilantras, bandidos, coronéis, cartórios e currais, eu mudo pra lá.

(Talvez o PSOL, ainda muito novinho, não tenha. Mas deixa crescer um pouco mais... É inevitável; você precisa ter um controle muito rígido para detectar logo e punir desvios de conduta. É óbvio que o PT falhou miseravelmente nisso... É óbvio, também, que outros não se importam a mínima com esse controle. E não são cobrados. Como já disse antes, cadê alguém encostar o Quércia na parede para perguntar “o que o PMDB vai fazer em relação aos seus deputados sanguessugas?”. Independentemente da infiltração da pilantragem oportunista, que ainda pode ocorrer, o PSOL me lembra o começo do PT, no que ele tinha de bom e de ruim... De bom: convicção, inconformismo, energia, mobilização de base, ideal. De ruim: uma certa arrogância (vocês são todos péssimos, nós temos a solução!), uma facilidade para criticar que não corresponde à dureza de administrar um país. Já pensou, querer aprovar qualquer coisa no Congresso que provavelmente teremos, tendo como base aliada apenas o PCdoB e o PSTU? Não dá!). Ainda sobre esse ponto: uma das críticas mais contundentes que se pode fazer ao PT é justamente sobre a “política de alianças”. Do extremo “não nos aliamos a ninguém” – lembra quando a Erundina tomou um couro por fazer parte do governo Itamar? – passamos ao “salve-se quem puder”. Aceitamos o apoio do Maluf para derrotar o PSDB... E eles (tucanos) fazem a mesma coisa (vão de ACM numa boa). Deprimente).

Nenhum comentário: