20 dezembro 2006

Carta de Despedida de Rodrigo Vianna


LEALDADE

Quando cheguei à TV Globo, em 1995, eu tinha mais cabelo, mais esperança, e também mais ilusões. Perdi boa parte do primeiro e das últimas. A esperança diminuiu, mas sobrevive. Esperança de fazer jornalismo que sirva pra transformar - ainda que de forma modesta e pontual. Infelizmente, está difícil continuar cumprindo esse compromisso aqui na Globo. Por isso, estou indo embora.

Quando entrei na TV Globo, os amigos, os antigos colegas de Faculdade, diziam: "você não vai agüentar nem um ano naquela TV que manipula eleições, fatos, cérebros". Agüentei doze anos. E vou dizer: costumava contar a meus amigos que na Globo fazíamos - sim - bom jornalismo. Havia, ao menos, um esforço nessa direção.

Na última década, em debates nas universidades, ou nas mesas de bar, a cada vez que me perguntavam sobre manipulação e controle político na Globo, eu costumava dizer: "olha, isso é coisa do passado; esse tempo ficou pra trás".

Isso não era só um discurso. Acompanhei de perto a chegada de Evandro Carlos de Andrade ao comando da TV, e a tentativa dele de profissionalizar nosso trabalho. Jornalismo comunitário, cobertura política - da qual participei de 98 a 2006. Matérias didáticas sobre o voto, sobre a democracia. Cobertura factual das eleições, debates. Pode parecer bobagem, mas tive orgulho de participar desse momento de virada no Jornalismo da Globo.

Parecia uma virada. Infelizmente, a cobertura das eleições de 2006 mostrou que eu havia me iludido. O que vivemos aqui entre setembro e outubro de 2006 não foi ficção. Aconteceu.

Pode ser que algum chefe queira fazer abaixo-assinado para provar que não aconteceu. Mas, é ruim, hem!

Intervenção minuciosa em nossos textos, trocas de palavras a mando de chefes, entrevistas de candidatos (gravadas na rua) escolhidas a dedo, à distância, por um personagem quase mítico que paira sobre a Redação: "o fulano (e vocês sabem de quem estou falando) quer esse trecho; o fulano quer que mude essa palavra no texto".

Tudo isso aconteceu. E nem foi o pior.

Na reta final do primeiro turno, os "aloprados do PT" aprontaram; e aloprados na chefia do jornalismo global botaram por terra anos de esforço para construir um novo tipo de trabalho aqui.

Ao lado de um grupo de colegas, entrei na sala de nosso chefe em São Paulo, no dia 18 de setembro, para reclamar da cobertura e pedir equilíbrio nas matérias: "por que não vamos repercutir a matéria da "Istoé", mostrando que a gênese dos sanguessugas ocorreu sob os tucanos? Por que não vamos a Piracicaba, contar quem é Abel Pereira?"

Por que isso, por que aquilo... Nenhuma resposta convincente. E uma cobertura desastrosa. Será que acharam que ninguém ia perceber?

Quando, no JN, chamavam Gedimar e Valdebran de "petistas" e, ao mesmo tempo, falavam de Abel Pereira como empresário ligado a um ex-ministro do "governo anterior", acharam que ninguém ia achar estranho?

Faltando seis dias para o primeiro turno, o "petista" Humberto Costa foi indiciado pela PF. No caso dos vampiros. O fato foi parar em manchete no JN, e isso era normal. O anormal é que, no mesmo dia, esconderam o nome de Platão, ex-assessor do ministério na época de Serra/Barjas Negri. Os chefes sabiam da existência de Platão, pediram a produtores pra checar tudo sobre ele, mas preferiram não dar. Que jornalismo é esse, que poupa e defende Platão, mas detesta Freud! Deve haver uma explicação psicanalítica para jornalismo tão seletivo!

Ah, sim, Freud. Elio Gaspari chegou a pedir desculpas em nome dos jornalistas ao tal Freud Godoy. O cara pode ter muitos pecados. Mas, o que fizemos na véspera da eleição foi incrível: matéria mostrando as "suspeitas", e apontando o dedo para a sala onde ele trabalhava, bem próximo à sala do presidente... A mensagem era clara. Mas, quando a PF concluiu que não havia nada contra ele, o principal telejornal da Globo silenciou antes da eleição.

Não vi matérias mostrando as conexões de Platão com Serra, com os tucanos.

Também não vi (antes do primeiro turno) reportagens mostrando quem era Abel Pereira, quem era Barjas Negri, e quais eram as conexões deles com PSDB. Mas vi várias matérias ressaltando os personagens petistas do escândalo. E, vejam: ninguém na Redação queria poupar os petistas (eu cobri durante meses o caso Santo André; eram matérias desfavoráveis a Lula e ao PT, nunca achei que não devêssemos fazer; seria o fim da picada...).

O que pedíamos era isonomia. Durante duas semanas, às vésperas do primeiro turno, a Globo de São Paulo designou dois repórteres para acompanhar o caso dossiê: um em São Paulo, outro em Cuiabá. Mas, nada de Piracicaba, nada de Barjas.!

Um colega nosso chegou a produzir, de forma precária, por telefone (vejam, bem, por telefone! Uma TV como a Globo fazer reportagem por telefone), reportagem com perfil do Abel. Foi editada, gerada para o Rio. Nunca foi ao ar!

Os telespectadores da Globo nunca viram Serra e os tucanos entregando ambulâncias cercados pelos deputados sanguessugas. Era o que estava na tal fita do "dossiê". Outras TVs mostraram o vídeo, a internet mostrou. A Globo, não. Provava alguma coisa contra Serra? Não. Ele não era obrigado a saber das falcatruas de deputados do baixo clero. Mas, por que demos o gabinete de Freud pertinho de Lula, e não demos Serra com sanguessugas?

E o caso gravíssimo das perguntas para o Serra? Ouvi, de pelo menos 3 pessoas diretamente envolvidas com o SP-TV Segunda Edição, que as perguntas para o Serra, na entrevista ao vivo no jornal, às vésperas do primeiro turno, foram rigorosamente selecionadas. Aquele diretor (aquele, vocês sabem quem) teria mandado cortar todas as perguntas "desagradáveis". A equipe do jornal ficou atônita. Entrevistas com os outros candidatos tinham sido duras, feitas com liberdade. Com o Serra, teria havido, deliberadamente, a intenção de amaciar.

E isso era um segredo de polichinelo. Muita gente ouviu essa história pelos corredores...

E as fotos da grana dos aloprados? Tínhamos que publicar? Claro. Mas, porque não demos a história completa? Os colegas que estavam na PF naquele dia (15 de setembro), tinham a gravação, mostrando as circunstâncias em que o delegado vazara as fotos. Justiça seja feita: sei que eles (repórter e produtor) queriam dar a matéria completa - as fotos, e as circunstâncias do vazamento. Podiam até proteger a fonte, mas escancarando o que são os bastidores de uma campanha no Brasil. Isso seria fazer jornalismo, expor as entranhas do poder.

Mais uma vez, fomos seletivos: as fotos mostradas com estardalhaço. A fita do delegado, essa sumiu!

Aquele diretor, aquele que controla cada palavra dos textos de política, disse que só tomou conhecimento do conteúdo da fita no dia seguinte. Quer que a gente acredite?

Por que nunca mostraram o conteúdo da fita do delegado no JN?

O JN levou um furo, foi isso?

Um colega nosso, aqui da Globo ouviu a fita e botou no site pessoal dele... Mas, a Globo não pôs no ar... O portal "G-1" botou na íntegra a fita do delegado, dias depois de a "CartaCapital" ter dado o caso. Era noticia? Para o portal das Organizações Globo, era.

Por que o JN não deu no dia 29 de setembro? Levou um furo?

Não. Furada foi a cobertura da eleição. Infelizmente.

E, pra terminar, aquele episódio lamentável do abaixo-assinado, depois das matérias da "CartaCapital". Respeito os colegas que assinaram. Alguns assinaram por medo, outros por convicção. Mas, o fato é que foi um abaixo-assinado em defesa da Globo, apresentado por chefes!

Pensem bem. Imaginem a seguinte hipótese: a revista "Quatro Rodas" dá matéria falando mal da suspensão de um carro da Volkswagen, acusando a empresa de deliberadamente não tomar conhecimento dos problemas. Aí, como resposta, os diretores da Volks têm a brilhante idéia de pedir aos metalúrgicos pra assinar um manifesto em defesa da empresa! O que vocês acham? Os metalúrgicos mandariam a direção da fábrica catar coquinho em Berlim!

Aqui, na Globo, muitos preferiram assinar. Por isso, talvez, tenhamos um metalúrgico na Presidência da República, enquanto os jornalistas ficaram falando sozinhos nessa eleição...

De resto, está difícil continuar fazendo jornalismo numa emissora que obriga repórteres a chamarem negros de "pretos e pardos". Vocês já viram isso no ar? Sinto vergonha...

A justificativa: IBGE (e, portanto, o Estado brasileiro) usa essa nomenclatura. Problema do IBGE. Eu me recuso a entrar nessa. Delegados de policia (representantes do Estado) costumavam (até bem pouco tempo) tratar companheiras (mesmo em relações estáveis) como "concubinas" ou "amásias". Nunca usamos esses termos!

Árabes que chegaram ao Brasil no início do século passado eram chamados de "turcos" pelas autoridades (o passaporte era do Império Turco Otomano, por isso a nomenclatura). Por causa disso, jornalistas deviam chamar libaneses de turcos?

Daqui a pouco, a Globo vai pedir para que chamemos a Parada Gay de "Parada dos Pederastas". Francamente, não tenho mais estômago.

Mas, também, o que esperar de uma Redação que é dirigida por alguém que defende a cobertura feita pela Globo na época das Diretas?

Respeito a imensa maioria dos colegas que ficam aqui. Tenho certeza que vão continuar se esforçando pra fazer bom Jornalismo. Não será fácil a tarefa de vocês.

Olhem no ar. Ouçam os comentaristas. As poucas vozes dissonantes sumiram. Franklin Martins foi afastado. Do Bom dia Brasil ao JG, temos um desfile de gente que está do mesmo lado.

Mas sabem o que me deixou preocupado mesmo? O texto do João Roberto Marinho depois das eleições.

Ele comemorou a reação (dando a entender que foi absolutamente espontânea; será que disseram isso pra ele? Será que não contaram a ele do mal-estar na Redação de São Paulo?) de jornalistas em defesa da cobertura da Globo:

"(...)diante de calúnias e infâmias, reagem, não com dúvidas ou incertezas, mas com repúdio e indignação. Chamo isso de lealdade e confiança".

Entendi. Ele comemora que não haja dúvidas e incertezas... Faz sentido. Incerteza atrapalha fechamento de jornal. Incerteza e dúvida são palavras terríveis. Devem ser banidas. Como qualquer um que diga que há racismo - sim - no Brasil.

E vejam o vocabulário: "lealdade e confiança". Organizações ainda hoje bem populares na Itália costumam usar esse jargão da "lealdade".

Caro João, você talvez nem saiba direito quem eu sou.

Mas, gostaria de dizer a você que lealdade devemos ter com princípios, e com a sociedade. A Globo, infelizmente, não foi "leal" com o público. Nem com os jornalistas.Vai pagar o preço por isso. É saudável que pague. Em nome da democracia!

João, da família Marinho, disse mais no brilhante comunicado interno:

"Pude ter certeza absoluta de que os colaboradores da Rede Globo sabem que podem e devem discordar das decisões editoriais no trabalho cotidiano que levam à feitura de nossos telejornais, porque o bom jornalismo é sempre resultado de muitas cabeças pensando".

Caro João, em que planeta você vive? Várias cabeças? Nunca, nem na ditadura (dizem-me os companheiros mais antigos) tivemos na Globo um jornalismo tão centralizado, a tal ponto que os repórteres trabalham mais como bonecos de ventríloquos, especialmente na cobertura política!

Cumpro agora um dever de lealdade: informo-lhe que, passadas as eleições, quem discordou da linha editorial da casa foi posto na "geladeira". Foi lamentável, caro João. Você devia saber como anda o ânimo da Redação - especialmente em São Paulo.

Boa parte dos seus "colaboradores" (você, João, aprendeu direitinho o vocabulário ideológico dos consultores e tecnocratas - "colaboradores", essa é boa... Eu não sou colaborador, coisa nenhuma! Sou jornalista!) está triste e ressabiada com o que se passou.

Mas, isso tudo tem pouca importância.

Grave mesmo é a tela da Globo - no Jornalismo, especialmente - não refletir a diversidade social e política brasileira. Nos anos 90, houve um ensaio, um movimento em direção à pluralidade. Já abortado. Será que a opção é consciente?

Isso me lembra a Igreja Católica, que sob Ratzinger preferiu expurgar o braço progressista. Fez uma opção deliberada: preferiram ficar menores, porém mais coesos ideologicamente. Foi essa a opção de Ratzinger. Será essa a opção dos Marinho?

Depois, não sabem porque os protestantes crescem...

Eu, que não sou católico nem protestante, fico apenas preocupado por ver uma concessão pública ser usada dessa maneira!

Mas, essa é também uma carta de despedida, sentimental.

Por isso, peço licença pra falar de lembranças pessoais.

Foram quase doze anos de Globo.

Quando entrei na TV, em 95, lá na antiga sede da praça Marechal, havia a Toninha - nossa mendiga de estimação, debaixo do viaduto. Os berros que ela dava em frente à entrada da TV traziam uma dimensão humana ao ambiente, lembravam-nos da fragilidade de todos nós, de como nossa razão pode ser frágil.

Havia o João Paulada - o faz-tudo da Redação.

Havia a moça do cafezinho (feito no coador, e entregue em garrafas térmicas), a tia dos doces...

Era um ambiente mais caseiro, menos pomposo. Hoje, na hora de dizer tchau, sinto saudade de tudo aquilo.

Havia bares sujos, pessoas simples circulando em volta de todos nós - nas ruas, no Metrô, na padaria.

Todos, do apresentador ao contínuo, tinham que entrar a pé na Redação. Estacionamentos eram externos (não havia "vallet park", nem catraca eletrônica). A caminhada pelas calçadas do centro da cidade obrigava-nos a um salutar contato com a desigualdade brasileira.

Hoje, quando olho pra nossa Redação aqui na Berrini, tenho a impressão que estou numa agência de publicidade. Ambiente asséptico, higienizado. Confortável, é verdade. Mas triste, quase desumano.

Mas, há as pessoas. Essas valem a pena.

Pra quem conseguiu chegar até o fim dessa longa carta, preciso dizer duas coisas...

1) Sinto-me aliviado por ficar longe de determinados personagens, pretensiosos e arrogantes, que exigem "lealdade"; parecem "poderosos chefões" falando com seus seguidores... Se depender de mim, como aconteceu na eleição, vão ficar falando sozinhos.

2) Mas, de meus colegas, da imensa maioria, vou sentir saudades.

Saudades das equipes na rua - UPJs que foram professores; cinegrafistas que foram companheiros; esses sim (todos) leais ao Jornalismo.

Saudades dos editores - que tiveram paciência com esse repórter aflito e procuraram ser leais às minúcias factuais.

Saudades dos produtores e dos chefes de reportagem - acho que fui leal com as pautas de vocês e (bem menos) com os horários!

Saudades de cada companheiro do apoio e da técnica - sempre leais.

Saudades especialmente, das grandes matérias no Globo Repórter - com aquela equipe de mestres (no Rio e em São Paulo) que aos poucos vai se desmontando, sem lealdade nem respeito com quem fez história (mas há bravos resistentes ainda).

Bem, pelo tom um tanto ácido dessa carta pode não parecer. Mas levo muita coisa boa daqui.

Perdi cabelos e ilusões. Mas, não a esperança.

Um beijo a todos.

Rodrigo Vianna.


Publicado na Terra Magazine.

http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1309377-EI6584,00.html

18 dezembro 2006

22 de dezembro: Dia do Orgasmo Global Sincronizado pela paz

Deu no Terra.

Dia 22 de dezembro, pessoas no mundo inteiro devem se dedicar a concentrar "energia positiva" para mudar o planeta. E como farão isso? Simples: praticando sexo. A campanha é promovida pelo site www.globalorgasm.org, e propõe que todos se fixem em pensamento de paz durante e depois do orgasmo (e quanto mais, melhor). O objetivo é tentar frear as energias de violência, agressão e guerras sobre o planeta.

Na convocação para o evento, o motivo citado pelo site é: "causar mudanças positivas no campo de energia da Terra por meio do orgasmo global sincronizado. Há mais duas frotas norte-americanas indo em direção ao Golfo Pérsico com equipamento a ser usado contra o Irã, portanto, a hora de mudar a energia da Terra é AGORA!".

A convocação é dirigida a todos os homens e mulheres do planeta, em todos os países (mas principalmente naqueles que dispõem de armas de destruição em massa). A data é 22 de dezembro, no lugar e hora em que as pessoas desejarem.

The Event

WHO? All Men and Women, you and everyone
you know.

WHERE? Everywhere in the world, but especially in countries with weapons of mass destruction.

WHEN?
Winter Solstice Day - Friday, December 22nd,
at the time of your choosing, in the place of your choosing and with as much privacy as you choose.

WHY? To effect positive change in the energy field of the Earth through input of the largest possible surge of human energy a Synchronized Global Orgasm. There are two more US fleets heading for the Persian Gulf with anti-submarine equipment that can only be for use against Iran, so the time to change Earth's energy is NOW!

Idéia sempre boa. Causa muito nobre.

A publicidade oficial

Mais um Ctrl+C Ctrl+V direto do Blog do Nassif.

A publicidade oficial

Boa matéria do Fernando Rodrigues, na "Folha" de hoje, sobre a publicidade oficial. Levantou vários ângulos, da distribuição de publicidade para a televisão até a audiência dos diversos canais.

O que se conclui do levantamento:

1. Todos os canais tiveram diminuição da propaganda do governo em 2006, menos a Record.

2. A publicidade na Bandeirantes caiu de R$ 38 mi em 2005 para R$ 31,4 mi em 2006 (até novembro). A da Rede 21 (onde está o Gamecorp) de R$ 3,4 mi para R$ 1,1 mi. O decréscimo nas duas frentes. Durante todo o ano a revista "Veja" apontou a Bandeirantes como beneficiária da publicidade oficial, depois que iniciou a parceria com a Gamecorp. Cadê a comprovação?

Rodrigues levanta uma boa gama de informações. Mas persiste o velho problema do escorpião, na hora das interpretações.

Por exemplo:

1. "Em 2003, a Record só ficou com 6% dos R$ 568,5 milhões de dinheiro público gasto com emissoras televisivas. Ao SBT coube 14,5%. Agora, a Record tem 12,8% e o SBT fica com 14,8%". A mesma matéria informa que de 2003 a 2006 a diferença de audiência entre as duas emissoras despencou de 11 pontos para apenas 4. De 2005 para 2006 caiu de 9 para 4 pontos.

2. Uma outra comparação é entre a participação de ambas na audiência e na publicidade. A Record teria ficado com 12,8% da publicidade federal contra 14,8% do SBT – contra uma audiência de 13 e 17 pontos respectivamente. Acontece que os dados levaram em conta a audiência total do dia, quando deveriam focar preferencialmente o horário nobre. O forte do SBT é a audiência infantil, enquanto a Record investiu no horário nobre. Seria estranho Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobrás anunciarem no Chaves ou em desenhos. Segundo informações que Rodrigues colheu junto à Record, de 2004 a 2006 a publicidade total na rede cresceu 147%. Aumentou para anunciantes privados e para anunciantes públicos.

3. Lembre-se que, quando o Canal 21 mudou a programação e abriu mão do jornalismo, perdeu o patrocínio da Caixa Econômica Federal, porque seu foco não era o público jovem.

Ou seja, à luz dos próprios dados levantados por Rodrigues, o aumento da publicidade na Record tem fundamento técnico. Que dados, então, sustentam o intertítulo da manchete principal de que o "aumento coincide com a reestruturação de programas e a saída de Boris Casoy"? É possível que tenha havido barganha. Mas cadê o fato que embasa a suspeita?

A nota oficial da Abril, divulgada na "Veja" desta semana, respondendo à Bandeirantes, informa que "assume plena responsabilidade por tudo o que publica e divulga". Não é a mesma coisa que "a Abril age com plena responsabilidade em tudo aquilo que publica e divulga".

enviada por Luis Nassif

do Blog do Nassif
http://z001.ig.com.br/ig/04/39/946471/blig/luisnassif/2006_12.html#post_18722107


11 dezembro 2006

Os silêncios da imprensa (Dalmo Dallari)

Opinião: Os silêncios da imprensa

Dalmo Dallari

A imprensa deve ter o direito de ser livre, a fim de que possa manter o povo informado de todos os fatos de alguma relevância para as pessoas e a humanidade, que ocorrerem em qualquer parte do mundo. Essa liberdade inclui o direito de expressar-se livremente, mesmo que se trate de informação que contrarie as convicções e os interesses dos governantes, havendo geral reconhecimento de que a imprensa livre é um instrumento necessário para a existência do Estado Democrático.

Além disso, no mundo contemporâneo, são muitas as atividades, de maior ou menor importância para a sociedade, que dependem de informações corretas, atualizadas e, quanto possível, precisas, cabendo à imprensa atender também a essa necessidade social. Bastam esses pontos para se concluir que as tarefas da imprensa configuram um serviço público relevante. E por isso a Constituição proclama e garante a liberdade de imprensa como direito fundamental.

Como é evidente, esse direito e essa garantia não são outorgados como um favor ou privilégio aos proprietários dos veículos de comunicação de massa, mas têm sua justificativa precisamente no caráter de serviço público relevante, da imprensa. Mas dos mesmos fundamentos que justificam o direito e a garantia de liberdade decorre o dever de informar honestamente, com imparcialidade, sem distorções e também sem omissões maliciosas, sem a ocultação deliberada de informações que possam influir sobre a formação da opinião pública. Assim, a liberdade de imprensa enquadra-se na categoria de direito/dever, semelhante a outros de relevante interesse social, como o sufrágio.

Três omissões recentes, da grande imprensa brasileira, configurando a ocultação deliberada de fatos e de informações relevantes, deixam evidente que muitos órgãos da imprensa, justamente ciosos de sua liberdade a ponto de reagir à mais leve suspeita de ameaça, andam faltando ao seu dever de informar. Uma dessas faltas foi a ocultação de um pronunciamento de defensores de Direitos Humanos, solidarizando-se com policiais vítimas de criminosos durante as agitações promovidas pelo crime organizado em São Paulo, no mês de maio deste ano. O texto do manifesto, não tendo mais do que 20 linhas, foi enviado às redações dos grandes jornais de São Paulo, os mesmos que costumam acusar os defensores de Direitos Humanos de defenderem os criminosos e de não darem solidariedade às vítimas. Nenhuma referência a esse pronunciamento foi publicada, enquanto era dada publicidade a outras manifestações de solidariedade.

Outro desrespeito ao dever de informar foi a negativa de publicar um manifesto de intelectuais, solidarizando-se com o professor Emir Sader, que sofreu uma absurda condenação por ter criticado, num artigo de jornal, uma raivosa, antidemocrática e grosseira referência do senador Jorge Bornhausen, de Santa Catarina, aos petistas, dizendo ser preciso "acabar com essa raça", bem ao estilo dos nazistas quando se referiam aos judeus. Um juiz, doutor Muller, solidarizou-se com o senador Bornhausen, e invocou a honra ofendida dos catarinenses como um dos fundamentos da condenação, mais política do que jurídica. E a mesma imprensa que tem condenado o que denomina "o silêncio dos intelectuais", por estes não darem apoio às acusações e insinuações levianas contra membros do governo e dirigentes do PT, praticou "o silêncio da imprensa", dando ampla repercussão à decisão condenatória e não publicando qualquer informação sobre o manifesto dos intelectuais.

A terceira falta ao cumprimento do dever de informar é o "silêncio ensurdecedor" da imprensa sobre o conteúdo de um famigerado dossiê, que teria sido comprado por petistas pagando somas altíssimas. Alguns quilômetros de espaço nos jornais e muitas horas na televisão e no rádio foram dedicados ao dossiê e, no entanto, a mesma imprensa que penetrou na intimidade de acusados, que divulgou informações sobre conversas telefônicas e encontros sigilosos de envolvidos no caso, que penetrou em meandros de operações financeiras, nada informou, absolutamente nada, sobre o conteúdo do dossiê. Acrescente-se ainda que a imprensa, num prodígio de eficiência, conseguiu fotografar uma pilha de dólares, supostamente ligada ao caso, guardada num local altamente protegido, sob a vigilância de um solerte delegado da Polícia Federal. E até agora nenhuma palavra sobre o conteúdo do dossiê, não se sabendo se este realmente existe ou se a imprensa, por alguma razão, não quer revelar o seu conteúdo.

Os casos aqui referidos, e outros que poderiam ser acrescentados, deixam patente que a liberdade de imprensa, absolutamente necessária no Estado Democrático, não está sofrendo qualquer cerceamento no Brasil. É indispensável que a imprensa use corretamente essa liberdade e cumpra seu dever de informar, sem incorrer na grave falta da ocultação intencional de informações, que pode ser tão grave ou danosa quanto a divulgação de informações falsas.

09 de dezembro de 2006

Publicado no Jornal do Brasil - JB Online
http://jbonline.terra.com.br/editorias/pais/papel/2006/09/12/pais20060912013.html